AMÉLIA MUGE & MICHALES LOUKOVIKAS
ARCHiPELAGOS / Passagens
I. REVISITANDO O ARQUIPÉLAGO
● O arquipélago
(Está Jónia em flôr? Onde está Atenas?)
● Katolophýromae (É tão profunda a dor)
/ENGLISH/ ARCHiPELAGOS • I. THE ARCHIPELAGO REVISITED
/ΕΛΛΗΝΙΚΑ/ ΑΡΧΙΠΕΛΑΓΟΣ • I. ΕΠΙΣΤΡΟΦΗ ΣΤΟ ΑΡΧΙΠΕΛΑΓΟΣ

ARCHiPELAGOS / Passagens: AMÉLIA MUGE & MICHALES LOUKOVIKAS
01. O arquipélago
a. Está Jónia em flôr? – b. Onde está Atenas?
(1800-1801, excertos)
– Friedrich Hölderlin (adaptação para português: Amélia Muge)
/ a. Tradicional do Egeu – b. Michales Loukovikas
• Arranjo: M. Loukovikas, António José Martins
-
Está Jónia em flôr?
Estão as garças de regresso à tua porta? Retomaram
Os barcos seu curso até às tuas costas? Já acalmaram as ondas
Na respiração das brisas por nós tão aguardadas? […]
Está Jónia em flôr? Está na altura? […]
-
Onde está Atenas?
Diz, onde está Atenas? Talvez por cima das urnas dos mestres
A tua amada cidade
[…] afundou-se por completo por entre as cinzas?
Resta ainda algum sinal dela, para que o marinheiro
De passagem a possa mencionar ou lembrar? […]O deus délfico silenciou, os caminhos são longos
Desolados e sós […]
• Voz falada: Maria José & A. Muge / Coros: Cramol, Maria Monda, Teresa Campos
• Clarino: Manos Achalinotópoulos / Contrabaixo: António Quintino / Guitarra: Dimitris Mystakidis
Guitarra portuguesa: Ricardo Parreira / Ney: Harris Lambrakis / Piano: Filipe Raposo
Violin, viola: Kyriakos Gouventas / Violoncelo: Catarina Anacleto
●

Friedrich Hölderlin, por Johanna Ebertz (1979)

Ruínas do Santuário de Atena em Delfos
02. Katolophýromae / É tão profunda a dor
– Eurípides • Tragédia “Orestes” (408 a.C., fragmentos)
• Adaptação / Arranjo: Michales Loukovikas
-
Estrofe
[…] eu a implorar, eu a implorar,
em pleno céu aberto como setas lançais
castigos pelo sangue, castigos pelo crime,
deixem que o pobre filho
de Agamemnon esqueça o seu desatino,
sua loucura, tão obsessiva. Tentando em vão,
ó pobre criatura, rastejar p’lo chão […]
-
Antístrofe
[…] é tão profunda a dor,
é tão profunda a dor.
Esse materno sangue, põe-te num desvario?
A ventura não vem todo o tempo aos mortais.
Como a vela que está,
num barco tão veloz por um deus sacudido
atormentado, tão agitado por pavores
num furioso mar de desastrosas ondas. […]
• Adaptação para português de Amélia Muge
• Canto: M. Loukovikas / Coro: Amélia Muge, M. Loukovikas, Andreas Karakotas,
Manos Achalinotópoulos • Clarino: M. Achalinotópoulos / Contrabaixo: António Quintino
Ney, flauta de bisel: Harris Lambrakis / Percurssão: José Salgueiro / Piano: Filipe Raposo
Violin, viola: Kyriakos Gouventas
●

Eurípides
-
(*) É de facto significativo que, naquele tempo, a música popular fosse avant-garde! Não é necessário referir que o nível cultural dos cidadãos era altissimo…

Orestes de Eurípides: Katolophyromae, a antístrofe
do primeiro estásimo (Papiro G 2315 de Viena)
● Agamemnon (Ἀγαμέμνων): rei de Micenas, conduz os helenos aos dez anos da Guerra de Troia, ocorrida algures no período entre 1260 e 1180 a.C; é obrigado a sacrificar a filha, Ifigénia, para que a sua frota viaje a salvo; no regresso, é assassinado a mando da esposa Clitemnestra (entre outras razões, para se vingar da morte da filha); por sua vez o filho, Orestes, assassina a mãe para vingar o pai, acto que o leva à loucura, sendo por isso objecto de vários mitos e peças de teatro. Ele encontra afinal a sua irmã viva em Táuris ou Táurica (Crimeia), para onde foi levada por Artemisa, que no último momento intervém, salvando-a. Eurípides escreve duas tragédias relacionadas com esta: Ifigénia em Áulide, onde o sacrifício ocorreu, e Ifigénia em Táuris. ● Tragédia (Τραγῳδία): no grego antigo τραγῳδία (tragodía, tragédia), é composta das palavras τράγος (trágos, bode) e ᾠδή (ode), resultando algo como ode ou canção dos bodes (ou dos sátiros, criaturas masculinas meio homens, meio bodes, parceiros itifálicos de Dioniso e por vezes de Pã); τραγούδι (tragoudi), derivado de tragédia, significa canção no grego moderno. Como forma de drama é marcada pelas características de seriedade, elevação e dignidade dos temas; apesar das suas origens obscuras, existe uma relação entre a tragédia e os ditirambos – cantos e danças em honra de Dioniso (ou Baco). ● Coro (χορός): grupo de artistas que, numa tragédia, dança, canta ou diz as suas falas em uníssono (coro, em grego, também significa dança, tropa, ou um lugar para dançar – em que é sinónimo de orquestra). Os estásimos são cantados pelo coro imóvel (στάσιμον, estático/estacionário), na orquestra; acompanhado de lira ou aulo e mostrando emoções, o coro comenta e analisa a situação dramática, com a função de reflectir a opinião pública sobre os assuntos da peça. ● Nesta passagem, o coro suplica primeiro às Erínias (deusas primitivas, implacáveis, indiferentes a sacrifícios, suplícios, ou outras atenuantes) para parar de atormentar Orestes, interpelando-o a ele de seguida.

O Remorso de Orestes (Orestes Perseguido pelas Erínias ou Fúrias),
de William-Adolphe Bouguereau (1862)